Concessionar a CP: quando o lucro entra pela porta, a segurança sai pela janela
Diz-se por aí que entregar a CP aos privados é a solução para todos os males. Que com a concessão virão comboios sem atrasos, trabalhadores sem greves e passageiros sem problemas.
STMEFE, Sindicato dos Trabalhadores do Metro e Ferroviários
A promessa é tentadora, mas falsa. Quem conhece a ferrovia sabe que nenhum serviço público melhora quando se troca o interesse das pessoas pelas contas de resultados. A concessão não elimina conflitos, elimina direitos. Nos países onde o caminho-de-ferro foi privatizado, como o Reino Unido, as greves não desapareceram. Multiplicaram-se. Quando o lucro se impõe à dignidade, os trabalhadores são empurrados para o silêncio ou para a rutura. E quando não há voz dentro das empresas, a primeira vítima é a segurança. Fala-se muito de eficiência e pouco de responsabilidade. Veja-se o exemplo do Elevador da Glória, em Lisboa: entregue a privados, com manutenção subcontratada, acabou por falhar com gravidade. Feridos. Pânico. Um aviso claro: quando se corta na manutenção, o preço não é económico, é humano. Na CP, uma avaria não para um carril. Pode custar vidas. Quem trabalha na ferrovia não quer fazer greve. Quer trabalhar com dignidade. Os técnicos de manutenção que passam noites a garantir tudo o que diz respeito à segurança — travões, sistemas elétricos, sinalização —, os maquinistas que atravessam o país de madrugada, os revisores que asseguram cada partida, todos sabem que um comboio não é um negócio. É uma responsabilidade nacional. Leva estudantes, idosos, trabalhadores, famílias inteiras. Não se gere à boleia do lucro, gere-se com compromisso público. Portugal não precisa de menos ferrovia, precisa de mais. Mais linhas, mais ligações ao interior, mais mobilidade para fixar pessoas fora dos grandes centros. Sem investimento público no caminho-de-ferro, falar em descentralização é apenas retórica. Um país coeso viaja sobre carris, não sobre promessas privadas. Privatizar a operação ou a manutenção da CP é colocar um intermediário entre o cidadão e o Estado, um intermediário que só fica onde há dinheiro. Linhas do interior? Populações isoladas? Tarifas sociais? Não cabem nos relatórios de acionistas. O caminho-de-ferro português não nasceu para dar lucro. Nasceu para ligar pessoas. E quem o serve todos os dias não pede privilégios, pede apenas condições para garantir que todos chegam bem ao destino.
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Bruno Oliveira
Sindicato dos Trabalhadores do Metro e Ferroviários